sábado, 13 de novembro de 2010

O Anel de Vidro


Aquele pequenino anel que tu me deste,
- Ai de mim - era vidro e logo se quebrou
Assim também o eterno amor que prometeste,
- Eterno! era bem pouco e cedo se acabou.

Frágil penhor que foi do amor que me tiveste,
Símbolo da afeição que o tempo aniquilou, -
Aquele pequenino anel que tu me deste,
- Ai de mim - era vidro e logo se quebrou

Não me turbou, porém, o despeito que investe
Gritando maldições contra aquilo que amou.
De ti conservo no peito a saudade celeste
Como também guardei o pó que me ficou
Daquele pequenino anel que tu me deste.

(Manuel Bandeira)

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Castro Alves



São duas flores unidas
São duas rosas nascidas
Talvez do mesmo arrebol,
Vivendo,no mesmo galho,
Da mesma gota de orvalho,
Do mesmo raio de sol.

Unidas, bem como as penas
das duas asas pequenas
De um passarinho do céu...
Como um casal de rolinhas,
Como a tribo de andorinhas
Da tarde no frouxo véu.

Unidas, bem como os prantos,
Que em parelha descem tantos
Das profundezas do olhar...
Como o suspiro e o desgosto,
Como as covinhas do rosto,
Como as estrelas do mar.

Unidas... Ai quem pudera
Numa eterna primavera
Viver, qual vive esta flor.
Juntar as rosas da vida
Na rama verde e florida,
Na verde rama do amor!

(Castro Alves)

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Ludov - Notre Voyage


"Nous nous rendrons compte
qu’il n’y a pas d’autre vie pour moi
qu’être ainsi près de toi"

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Das vantagens de ser bobo. (Clarice Lispector)


O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir, tocar no mundo.


O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo, estou pensando”.

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia.

O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas.

O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver.

O bobo parece nunca ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.

Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer.

Resultado: não funciona.

Chamado um técnico, a opinião deste era que o aparelho estava tão estragado que o concerto seria caríssimo: mais vale comprar outro.

Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e, portanto estar tranqüilo.

[...]

É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.